Wednesday, August 15, 2018

Hands in Poems: Susana Sánchez Aríns (II)



na cozinha

esfregar a louça com calma
levar o estropalho aos poucos
cobrindo as nódoas
com a escuma dos dias

desenhar círculos com maos
enrugadas e gemas gélidas
moles estigmas da rotina
que pesam como cruz nas costas.

eliminar com primor cada resto
cada borra cada escória
marcas de prazeres velhos
impetuosamente coladas ao esmalte

baptizer cada manhá a louça
com água branda da torneira
água que se repite sempre
água que nunca é a mesma

espelhar no fundo do prato
estas carnes alinhadas
em óleos cremes vinagres
face resignada como anho
inocente na ara sacrificial.

presidir com pam e vinho
a cerimónia quotidiana
que me mantém na borbulha
que me leva ao nada
que me aniquila          ininterruptamente.

En [de] construçom (2009)

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