Friday, August 17, 2018

Letters in Poems: Nuno Júdice (V)




AO CAIR DA NOITE

No banco do jardim, como numa sala de espera, 
pergunta se alguém virá para a buscar, antes
que a noite chegue. E eu, do outro lado do tempo,
abro o caderno para lhe escrever: "Um dia
saberás o que disseram todas as cartas
que não abriste; e perante o vazio a que
a tua vida se resume, responderás que
pouco importa o tempo, quando a eternidade
te cobriu com a sua noite, há muito".
Depois, vou ao correio. "Esqueceu-se
de pôr a morada", diz-me o empregado.
"Não sei onde mora", digo-lhe.
E meto na casa o envelope em branco
para que alguém, um dia, o descubra
para o ler, num banco de jardim,
pouco antes da noite, pensando
no que é a vida em que todo o futuro foi
esse instante que não chegou a ser.

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